Quinta-feira, 24 Abril

A equipe de jornalismo do Portal Alex Braga mostra com exclusividade a dura realidade de quem está precisando de atendimento no Hospital e Pronto Socorro 28 de Agosto neste começo de 2025. Duas filhas que estão com os pais internados na unidade relatam o descaso, a falta de atendimento e a desinformação na unidade gerida pela Organização Social Associação de Gestão, Inovação e Resultados em Saúde (Agir), contratada por R$ 2 bilhões pelo governo Wilson Lima.


11 dias esperando um cateterismo


O caso do senhor Luiz Lima da Silva, de 66 anos, é um dos exemplos mais trágicos dessa realidade. Após 11 dias internado, ele só conseguiu realizar o procedimento de cateterismo cardíaco graças à mobilização de sua filha.

Luana da Silva, assistente administrativa, que recorreu às redes sociais para denunciar a situação. Em vídeo divulgado em seu Instagram, Luana chamou a atenção para a gravidade do caso e expôs a urgência de melhorias na assistência médica do hospital.

Ao Portal Alex Braga ela contou sua agonia.

“Somente após eu ir expor o caso nas redes sociais, meu pai conseguiu, na tarde desta quarta-feira (19), realizar o procedimento do cateterismo. Mas eu te garanto que na enfermaria onde ele está existem outras famílias passando por situação parecida com a dele, aguardando por dias a realização de exames, além de ainda receber informações desencontradas vindas de funcionários do hospital”, relatou Luana.

Luiz foi internado no dia 7 de fevereiro com sintomas de falta de ar, mas, segundo sua filha, os atendentes inicialmente duvidaram da gravidade de sua condição, já que a saturação estava dentro dos níveis normais.

A única razão pela qual o paciente foi atendido rapidamente foi o histórico de diabetes, com glicemia elevada.

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Luana, no entanto, não sabia que ele estava tendo um infarto naquele momento, uma condição negligenciada pelos médicos durante o atendimento inicial.

O sofrimento do senhor Luiz não parou por aí. Após ser internado, ele passou três dias em uma sala improvisada, sem direito a banho, já que não havia banheiro no local. Quando finalmente foi acomodado em um leito, o que parecia ser o fim do pesadelo se transformou em mais uma humilhação. Os exames de Luiz não estavam anexados ao Núcleo Interno de Regulação (NIR), o que fez com que outros pacientes fossem atendidos antes dele.

“Minha irmã resolveu se deslocar até o Francisca Mendes para ter mais informações. A enfermeira responsável disse que tinha leito, sim, tinha espaço, só que o setor responsável pelo translado (NIR) não tinha anexado o exame de ecografia dele, feito no dia 8 de fevereiro. E já tinha chegado a vez dele várias vezes, mas por falta desse exame anexado não tinham chamado ele ainda. Foi quando eu me revoltei e fiz o vídeo. Duas horas depois, minha sobrinha foi ao NIR e o exame já estava anexado. E na noite do mesmo dia do vídeo, já informaram que o procedimento estava marcado para essa quarta”, contou.


Foi somente após a pressão de Luana nas redes sociais que duas horas depois, o procedimento de cateterismo foi agendado para a tarde de quarta-feira (19), mas o dano à saúde de Luiz já estava feito. Além da demora no atendimento, a família foi informada que ele agora enfrenta problemas renais, resultado da imprudência e da falta de cuidados médicos adequados.

Demora resultou em mais problemas

“Acabaram de nos informar que meu pai está com problemas nos rins. Se ele fizer o cateterismo hoje, corre o risco de precisar de diálise. É inaceitável a imprudência do Hospital 28 de Agosto com um paciente que está internado há 11 dias. Eles nem sequer comunicaram à família sobre a condição renal dele, quanto mais iniciaram um tratamento adequado para essa situação”, desabafou Luana, que exige respostas.

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Meu pai pode morrer


O caso de Luiz não é isolado. Ailton dos Santos Cordovil, de 61 anos, está internado no Hospital 28 de Agosto há 16 dias, aguardando uma cirurgia cardíaca que ainda não aconteceu. A demora e a falta de comunicação por parte da equipe médica têm gerado sofrimento não só para Ailton, mas para toda a família.

De acordo com Alessandra, filha de Ailton, o pai estava agendado para a cirurgia na última quinta-feira (13), mas não recebeu qualquer aviso sobre o cancelamento do procedimento.

“Meu pai perdeu a cirurgia na quinta-feira, mas ninguém avisou a ele ou à nossa família. Ele só soube na sexta-feira, quando o Samu foi buscá-lo. Até aquele momento, ele tinha se alimentado, e foi justamente por isso que perdeu a cirurgia. Não fomos orientados de que ele deveria ficar em jejum”, relatou Alessandra.

O descaso não se limitou apenas à falta de comunicação. Mesmo após a queixa formal e uma denúncia feita por Alessandra, a resposta do hospital foi vaga. “Disseram que iriam encaixá-lo na agenda, mas até agora nada. No sábado, me informaram que ele estava na dieta zero, mas até hoje não há previsão para a cirurgia”, completou.

A demora no atendimento tem gerado mais complicações para o estado de saúde de Ailton. Segundo Alessandra, seu pai está com a barriga inchada devido ao uso de medicação e apresenta sinais de impaciência. “Até agora, meu pai está com a barriga completamente inchada por causa da medicação. Ele está impaciente, e nós também. A situação está insustentável”, desabafou. A pressão sobre a família aumentou com o alerta de dois médicos do hospital, que informaram que Ailton corre o risco de morte caso a cirurgia não seja realizada com urgência.

Na manhã desta quinta-feira (20), Alessandra procurou o Núcleo Investigativo do Portal Alex Braga para denunciar a situação. Segundo ela, o problema não se restringe apenas a seu pai. “Eu vim acompanhar meu pai e estou desde as 7h da manhã na fila esperando atendimento, com diversas pessoas. Pouco mais de uma hora se passou e essa fila só aumenta. Cadê o atendimento?”, questionou, expressando sua frustração.

A família de Ailton aguarda uma resposta imediata da Secretaria de Saúde, temendo que o quadro de seu pai se agrave ainda mais devido à demora na realização da cirurgia necessária.

Wilson Lima não mostra a realidade


Em janeiro deste ano, o governador do Amazonas, Wilson Lima, apresentou um balanço positivo sobre o desempenho do Complexo Hospitalar Sul, destacando um aumento significativo nos atendimentos e procedimentos médicos logo no primeiro mês da implementação do novo modelo de gestão integrada. Segundo Lima, entre 1º e 31 de dezembro de 2024, foram realizados 11,6 mil atendimentos nas unidades do complexo, evidenciando uma expansão no acesso à saúde pública no estado.

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De acordo com o levantamento apresentado pelo governador, a média diária de cirurgias gerais saltou de 15 para 24 procedimentos, enquanto as cirurgias ortopédicas cresceram de 5 para 15 procedimentos diários, indicando uma melhoria no atendimento aos pacientes que necessitam de cirurgias. Durante a coletiva de imprensa, Lima reafirmou seu compromisso com a melhoria do sistema de saúde:

“Nós vamos entregar uma saúde muito melhor do que encontramos. Estamos em um processo de readequação. Nosso compromisso é com o cidadão que procura a unidade de saúde, com o paciente que precisa ser operado, com aquele que aguarda uma resposta do poder público.”

No entanto, enquanto o governo destaca esses avanços, a realidade enfrentada por muitos pacientes no Hospital 28 de Agosto, uma das principais unidades de saúde do estado, parece desmentir esse quadro otimista. Nos corredores do hospital, relatos de pacientes e familiares apontam para um cenário de descaso e atrasos nos atendimentos, contrastando com os dados divulgados pelo governador.

A situação no Hospital 28 de Agosto revela uma outra face da realidade, onde a agilidade prometida parece não se refletir no dia a dia da unidade. Os desafios enfrentados por quem busca atendimento médico na unidade evidenciam que, embora números positivos sejam apontados, a qualidade do atendimento ainda é uma preocupação constante para muitos cidadãos.

Essa discrepância entre os avanços anunciados e as dificuldades vivenciadas por pacientes e familiares coloca em xeque a efetividade das mudanças implementadas e levanta a questão de até que ponto as melhorias no modelo de gestão estão sendo efetivas na realidade das unidades de saúde que atendem a população mais vulnerável.

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O cenário, portanto, continua a exigir atenção e ajustes, especialmente em hospitais como o 28 de Agosto, que seguem sendo fundamentais no atendimento à saúde da população, mas que ainda enfrentam dificuldades estruturais e operacionais que comprometem a qualidade do serviço prestado.

OSS Agir embolsa R$ 60 milhões e a saúde continua um caos

Em mais um capítulo controverso da gestão da saúde no Amazonas, a Organização Social Agir (Associação de Gestão, Inovação e Resultados em Saúde), responsável pela administração do Complexo Hospitalar da Zona Sul (CHZS), composto pelo HPS 28 de Agosto e pelo Instituto Dona Lindu, continua sendo alvo de críticas. Embora já tenha recebido mais de R$ 60 milhões, a demora no atendimento e as longas filas para procedimentos cirúrgicos seguem sendo problemas constantes.

O contrato firmado entre a Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (SES-AM) e a Agir, o CONTRATO DE GESTÃO Nº 002/2024, prevê um investimento global de R$ 2.044.494.743,36 (dois bilhões, quarenta e quatro milhões, quatrocentos e noventa e quatro mil, setecentos e quarenta e três reais e trinta e seis centavos), com vigência de 60 meses, ou seja, cinco anos.

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Desde sua assinatura, a Agir já recebeu parcelas significativas do valor acordado. Em 3 de dezembro de 2024, o governador Wilson Lima autorizou o pagamento de R$ 31.274.737,29 (trinta e um milhões, duzentos e setenta e quatro mil, setecentos e trinta e sete reais e vinte e nove centavos) à organização. Em 4 de fevereiro de 2025, outro pagamento no mesmo valor foi realizado, totalizando até agora R$ 62.549.474,58 (sessenta e dois milhões, quinhentos e quarenta e nove mil, quatrocentos e setenta e quatro reais e cinquenta e oito centavos).

Veja os pagamentos:

Esses pagamentos iniciais de um contrato que ultrapassa os R$ 2 bilhões, no entanto, não têm sido acompanhados de melhorias visíveis nos serviços prestados. Denúncias de irregularidades e corrupção envolvendo a Agir em Goiânia levantam sérias preocupações sobre a capacidade da organização em administrar unidades de saúde tão estratégicas para o estado do Amazonas. O histórico de investigações e acusações de má gestão de recursos públicos não passa despercebido pela população e exige um acompanhamento rigoroso das autoridades.

Enquanto isso, o sistema de saúde pública do Amazonas enfrenta problemas crônicos, como equipamentos precários, a escassez de leitos, a demora no agendamento de cirurgias e a insatisfação crescente da população com a qualidade do atendimento. Esses desafios revelam um modelo de gestão pública que prioriza contratos bilionários com organizações questionáveis em vez de atender às reais necessidades da população.

Em um cenário de crescente insatisfação, a sociedade exige respostas e soluções que vão além da distribuição de recursos financeiros para organizações com histórico de gestão duvidosa. A falta de transparência, a ineficiência nos serviços e os pagamentos milionários levantam questões sobre a real prioridade na gestão da saúde pública no estado do Amazonas.

Escândalos na saúde


A gestão do governador Wilson Lima na área da saúde no Amazonas tem sido amplamente marcada por diversos escândalos, especialmente relacionados ao desvio de recursos públicos em plena pandemia de Covid-19. Nos últimos anos, a situação se agravou com a prisão de quatro ex-secretários de Saúde, acusados pela Polícia Federal de envolvimento em esquemas de corrupção que desviaram milhões de reais.

O próprio governador não está isento das acusações. Ele se tornou réu no Superior Tribunal de Justiça (STJ), sendo acusado de liderar uma organização criminosa que desviou recursos da saúde pública durante o período crítico da pandemia. O caso que mais chama atenção é o da compra superfaturada de respiradores pulmonares, adquiridos de maneira irregular de uma loja de vinhos — um episódio que simboliza um dos maiores escândalos de corrupção em meio à crise de saúde pública que vitimou milhares de vidas.

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Enquanto a população amazonense enfrentava os desafios impostos pela Covid-19, os desfalques nos recursos destinados à saúde comprometeram ainda mais o sistema de saúde do estado, intensificando o sofrimento de uma sociedade que já lidava com a escassez de leitos e equipamentos essenciais para o enfrentamento da pandemia.

Esses episódios de corrupção e o uso indevido dos recursos públicos geraram protestos e indignação, não apenas entre os moradores do Amazonas, mas também em todo o Brasil. O caso segue sendo investigado, com as autoridades buscando responsabilizar os envolvidos em um momento em que a confiança na gestão pública está seriamente abalada.

Posicionamento da SES e da Agir


O Núcleo investigativo do Portal Alex Braga, tentou contato com a Ses e a OSS Agir, pedindo esclarecimentos sobre os casos dos senhores citados nesta matéria, bem como as denúncias de descaso, desinformação, demora no atendimento e cirurgias, além de enormes filas. Porém, até a publicação desta reportagem não obtivemos respostas. O espaço segue aberto para mais esclarecimentos.