A crise no sistema de saúde pública do Amazonas, que se arrasta há anos, continua a ser uma preocupação constante. Praticamente toda semana, o Núcleo Investigativo do Portal Alex Braga recebe denúncias de pacientes que estão à espera de cirurgias, exames e até medicamentos, enfrentando longas filas nos principais hospitais de Manaus, como os hospitais João Lúcio e 28 de Agosto.
Porém, em meio a essa crise, o governador Wilson Lima fez uma escolha polêmica: contratou, por meio de dispensa de licitação, uma empresa de tecnologia da informação do Estado do Piauí (ETIPI) para fornecer um serviço de telessaúde. O valor total do contrato é de impressionantes R$ 196 milhões.

A contratação, publicada no Diário Oficial do Estado na última terça-feira (25), visa implantar e operar uma plataforma tecnológica de telessaúde. O serviço, que inclui customização, treinamento e suporte técnico 24 horas, será oferecido pela ETIPI, uma sociedade mista de tecnologia do Estado do Piauí.
O contrato terá a duração de 14 meses e estipula que a empresa fornecerá a licença de software, além de disponibilizar um corpo clínico para prestar serviços de teleconsulta e telediagnóstico, atendendo às necessidades da Secretaria de Saúde do Amazonas (SES-AM).

A assinatura do contrato foi realizada pelo Secretário Executivo da SES, Silvio Romano Benjamin Júnior, gerando discussões sobre o real impacto e a viabilidade de um projeto de telessaúde em um estado com tantas dificuldades estruturais.
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Médico online
O serviço de telessaúde já vem sendo utilizado em algumas regiões do Amazonas. De acordo com informações obtidas no site do governo do estado, no primeiro semestre deste ano, 9.806 pessoas receberam atendimento médico via telessaúde, com a oferta de consultas em 12 especialidades, alcançando 42 municípios. Esse serviço faz parte do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS), que visa realizar consultas à distância por meio de telemedicina, apoiado pelo Governo Federal.
A secretária de Estado de Saúde, Nayara Maksoud, explicou que o projeto de telessaúde está inserido no SUS Digital, que tem como principal objetivo ampliar o acesso da população às consultas com especialistas. Apesar do avanço, o número de atendimentos ainda é limitado, levando muitos a questionar a eficácia do modelo diante da magnitude das carências na saúde pública do estado.
Telessaúde e seus desafios
Um dos maiores obstáculos ao projeto de telessaúde no Amazonas é a falta de infraestrutura de conectividade no estado. Municípios afastados enfrentam constantemente dificuldades com o sinal de internet e de telefonia móvel, o que compromete a efetividade de qualquer serviço digital. Em agosto do ano passado, o jornal Folha de S.Paulo publicou uma matéria destacando como a internet de baixa qualidade é uma barreira para o acesso à saúde na região Norte do Brasil, com o Amazonas figurando entre os piores estados do país em conectividade.
Segundo dados do Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação), em 2009, apenas 24% dos domicílios na Região Norte possuíam acesso à internet. Esse número subiu para 81% em 2020, mas ainda fica abaixo da média nacional de 83%. Essa realidade coloca em xeque a capacidade do governo do Amazonas de levar serviços de telessaúde a áreas onde o sinal de internet é instável ou inexistente.
E agora Wilson?
Diante dessa realidade, muitos se perguntam: como o governo do Amazonas, Wilson Lima, pretende garantir que o serviço de telessaúde chegue efetivamente às regiões mais remotas do estado, considerando a precariedade da conectividade local?
Com o alto investimento na contratação da ETIPI e o crescente número de pacientes em espera por atendimento nas unidades de saúde, resta a dúvida se esse modelo será eficaz ou se, mais uma vez, o problema da saúde pública no Amazonas será resolvido apenas no papel.
O outro lado
O Núcleo Investigativo do Portal do Alex Braga, entrou em contato com a Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (Ses-AM), para questionar a contratação desta empresa com dispensa de licitação e como o governo pretende levar a saúde virtual para o interior do estado. Mas até a publicação desta reportagem não tivéssemos respostas.
O espaço segue aberto para esclarecimentos.

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