Durante toda a gestão do governador Wilson Lima (União Brasil), o Governo do Amazonas tem acumulado denúncias de abandono e descaso com os servidores da segurança pública. A mais recente vem do Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM), que acusa o Executivo de omissão prolongada no custeio de fardamento de policiais e bombeiros militares, um item essencial para o exercício da função e cuja ausência obriga os próprios servidores a arcarem com os custos de trabalho.
A denúncia levou à abertura de inquérito civil e à expedição de recomendação formal do MPAM para que o Estado adote medidas emergenciais no pagamento do auxílio-fardamento, benefício suspenso desde 2022, sem aviso prévio ou justificativa pública.
“Policial militar paga para trabalhar”
De acordo com o Ministério Público, a situação é grave e persistente. O Estado não fornece o fardamento nem indeniza os servidores, transferindo integralmente o custo ao militar. “Não há o que discutir. É um direito garantido e o Estado tem orçamento para isso. Na omissão do governo, cabe ao MP agir para garantir a lei”, afirmou o promotor Daniel Amazonas, da 61ª Promotoria de Justiça.
O promotor Armando Gurgel Maia, também signatário da recomendação, foi direto: “Hoje, não existe nenhum mecanismo de custeio do fardamento dos militares estaduais. O policial é obrigado a pagar para trabalhar, sob pena de punição disciplinar. Isso é inaceitável”.
Segundo o documento, o governo tem 30 dias para implementar um abono emergencial que indenize o efetivo ativo e 60 dias para encaminhar à Assembleia Legislativa um projeto de lei que estabeleça uma política permanente de custeio do uniforme.
LEIA MAIS: Wilson Lima é cobrado na rua por concursados esquecidos da Segurança Pública: ‘me chama’
Quatro anos sem farda
O problema, entretanto, não é novo. O auxílio-fardamento, que vinha sendo pago anualmente, foi interrompido em 2022, no início do segundo mandato de Wilson Lima. Desde então, policiais e bombeiros vêm bancando do próprio bolso as fardas, coturnos, distintivos e equipamentos básicos de serviço.
“Antes, havia um decreto que garantia o abono. Agora, nada. Quatro anos sem receber um centavo. O policial militar está gastando do próprio bolso cerca de R$ 3 mil por ano só para manter o uniforme em dia”, denuncia o coronel Claudenir Barbosa, presidente da Associação dos Militares Estaduais do Amazonas (AMAM).
Ele critica a postura do governador, a quem chama de “apresentador de ilusões”.
“Wilson Lima aparece nas redes entregando viaturas e equipamentos, mas ignora o básico: o ser humano que veste a farda. Ele sabe da situação e finge que não. O policial paga para trabalhar e o governo se acomoda, porque sabe que o servidor tira do próprio bolso para não passar vergonha na rua”, afirma.

Associações divididas e aparelhadas
Outra denúncia recorrente entre os militares é de que o governo mantém o controle sobre algumas associações de classe, utilizando-as como “peneiras políticas” para abafar o descontentamento da tropa.
“Esses presidentes de clubes e associações que ocupam cargos no governo não representam os policiais. Fingem negociar, mas são porta-vozes do Palácio. Enquanto isso, o soldado continua pagando R$ 700 numa calça e camisa e até R$ 300 em um coturno que precisa durar o ano inteiro”, relata Claudenir Barbosa.
Histórico de descaso
Desde 2018, o benefício era pago de forma periódica:
- 2018: R$ 2.275,00
- 2020: R$ 2.745,02
- 2021: R$ 2.999,48
- 2022: R$ 3.098,46
Após 2022, nenhum pagamento foi realizado. Além do atraso no auxílio-fardamento, as associações cobram também a data-base, defasada em cerca de 20%, e promoções atrasadas dentro da corporação.
MP ameaça acionar Justiça
Caso o governo não apresente solução em até 10 dias úteis, o MPAM poderá recorrer à Justiça com uma Ação Civil Pública, pedindo bloqueio de recursos e multa pessoal a gestores responsáveis. O órgão também avalia encaminhar o caso ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público de Contas, para apurar possível ato de improbidade administrativa.
Para o Ministério Público, o caso simboliza a deterioração do compromisso do governo com a segurança pública.
“O Estado tem o dever constitucional de fornecer os meios materiais necessários ao exercício da função policial. Quando o policial precisa pagar pelo seu próprio fardamento, é sinal de que o governo falhou no mais básico”, conclui a recomendação.
NOTA
O Núcleo de Reportagem Investigativa do Portal Alex Braga entrou em contato com o Governo do Amazonas para falar sobre o caso, mas até o fechamento desta edição não obtivemos respostas. O espaços segue aberto para esclarecimentos.

LEIA MAIS: Do que o governador Wilson Lima ri enquanto a concursada da Segurança Pública chora?

