Quinta-feira, 9 Outubro

Enquanto a Prefeitura de Careiro Castanho (AM), recebeu mais de R$ 1,4 milhões entre 2024 e 2025 exclusivamente para o transporte escolar, crianças da zona rural seguem sem acesso às aulas por falta de combustível nas embarcações e salários atrasados dos barqueiros, sob a gestão da prefeita Mara Alves (Republicanos). Os valores, oriundos do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE), foram oficialmente repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), conforme dados atualizados até 7 de julho.

Segundo os registros do FNDE, foram transferidos R$ 959.592,92 em 2024 e R$ 489.407,75 até março de 2025, totalizando R$ 1.449.000,67. Apesar disso, barqueiros contratados pela prefeitura denunciaram que não recebem há meses, inviabilizando o transporte fluvial dos alunos das comunidades ribeirinhas.

Dinheiro no papel, abandono na prática

Apesar dos repasses, barqueiros contratados pela prefeitura denunciam que não recebem salários há meses, inviabilizando o transporte fluvial dos estudantes das comunidades ribeirinhas.

Nas comunidades Nossa Senhora de Fátima II e Santa Maria, pais e condutores confirmam que as crianças estão sem aula porque os barqueiros não têm gasolina nem salário. Cada profissional deveria receber cerca de R$ 2 mil mensais, mais da metade desse valor é gasto apenas com combustível.

“Desde fevereiro, quando começou o ano letivo, só recebemos dois meses: maio e julho. É impossível continuar sem gasolina. A gente quer trabalhar, mas não tem como”, desabafou Thaís Oliveira, mãe de aluno e condutora de embarcação.

Segundo relatos, os trabalhadores nunca receberam cópia dos contratos assinados, feitos em reuniões a portas fechadas com representantes da Secretaria Municipal de Educação. Os pagamentos parciais só foram efetuados após a repercussão negativa na imprensa, numa tentativa de abafar o escândalo.

Enquanto isso, famílias da região do Lago do Janauacá enfrentam um dilema cruel: colocar comida na mesa ou garantir a ida dos filhos à escola.

“Só queremos o direito dos nossos filhos voltarem a estudar. O futuro deles depende disso. Não temos dinheiro para combustível toda vez. Ou fazem as atividades em casa ou ficam sem nada. Eu ajudo, mas elas estão sendo prejudicadas”, relata Zivanide Rodrigues, mãe de duas meninas de 5 e 8 anos.

Reincidência e abandono

A crise atual não é um caso isolado. Em agosto de 2025, a prefeita Mara Alves já havia sido denunciada por atrasar salários dos barqueiros, ausência de fardamento escolar e falta crônica de combustível. À época, trabalhadores fecharam a BR-319 em protesto. O caso foi divulgado pelo portal Alex Braga, na reportagem: “Prefeita do Careiro Castanho é acusada de calotar barqueiros: ‘votei nela, me arrependo’”.

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Os protestos escancararam o abandono sistemático da zona rural. Em muitos casos, estudantes comparecem à escola apenas duas vezes por semana, quando conseguem transporte. Vídeos que circularam nas redes sociais mostraram faixas com mensagens como: “Nossos filhos estão sofrendo!”.

Escolas precárias, futuro ameaçado

Além do transporte, o descaso se estende à infraestrutura escolar. Escolas de madeira com pisos quebrados, banheiros sem condições de uso, caixas d’água prestes a desabar e professores dando aulas ao ar livre completam o retrato de negligência.

A situação descrita por Zivanide Rodrigues se repete em diversas comunidades:

“Ou compramos comida ou garantimos a ida das crianças à escola.”

Mesmo com os recursos federais sendo repassados normalmente, alunos permanecem fora da sala de aula, barqueiros trabalham sem garantias e o ano letivo escorre pelo ralo da má gestão.

NOTA

O Núcleo de Reportagem Investigativa do Portal Alex Braga entrou em contato com a prefeitura do Careiro Castanho para falar da situação dos alunos e profissionais que estão sem receber, mas até a publicação desta matéria não obtivemos respostas. O espaço segue aberto para esclarecimentos.

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